Elas são minúsculas e letais; e o manejo bem feito de suas populações pode evitar bilhões de dólares de prejuízos na agricultura, além de proteger a saúde de seres humanos.
As vespinhas do gênero Nasonia estão entre os maiores aliados do homem no mundo dos insetos, embora seja difícil no dia-a-dia reconhecer esses bichos, alguns com o tamanho de uma cabeça de alfinete.
Mas sua importância para a ciência é tanta que nada menos que três espécies do gênero tiveram seu genoma sequenciado por um consórcio internacional de mais de 150 pesquisadores, incluindo alguns de instituições brasileiras: Nasonia vitripennis, N. giraulti, e N. longicornis.
Começou na sexta-feira passada a publicação de artigos científicos sobre o sequenciamento, com a sua descrição na revista "Science" e outro na revista "PLoS Genetics". Nas próximas semanas mais artigos vão surgir sobre um inseto que tem potencial de rivalizar com as famosas moscas-das-frutas na atenção dos geneticistas.
As Nasonia agem de modo diabólico e, numa visão antropocêntrica, extremamente cruel. A vespinha parasitóide pica sua vítima --que pode ser um ovo, uma pupa ou larva de outro inseto-- e deposita seus ovos. A vítima continua viva e vai sendo comida aos poucos pelas larvinhas da vespa.
A iniciativa de sequenciar o genoma da Nasonia foi de John Werren, da Universidade de Rochester, no Estado de Nova York, e Stephen Richards, do Baylor College of Medicine, de Houston, no Texas.
"Existem mais de 600 mil espécies dessas incríveis criaturas, e nós devemos muito a elas. Se não fosse pelos parasitóides e outros inimigos naturais, nós estaríamos cheios até o joelho em insetos pragas", declarou Werren.
"Estas vespas são capazes de parasitar várias espécies de moscas, mas existe certa preferência por algumas espécies. Selecionar ou criar linhagens mais eficientes no ataque de determinada espécie é uma das possibilidades, mas não há pesquisa suficiente ainda para determinar os critérios de seleção para estes programas de melhoramento genético", afirma o brasileiro Alexandre dos Santos Cristino, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP.
"De fato, o sequenciamento do genoma é o primeiro passo para isto, já que revela o conteúdo genético que pode ser potencialmente modificado", continua Cristino. O grupo do Departamento de Biologia da USP de Ribeirão Preto também participou da publicação do genoma de abelha Apis mellifera, publicado em 2006.
Além de facilitar o estudo com as vespas e o grande potencial de aplicação na melhoria do controle de pragas agrícolas, o sequenciamento do genoma e a identificação dos genes vai facilitar estudos básicos em genética e evolução.
Sexo determinado
Um detalhe curioso é a diferença no material genético de machos e fêmeas. As vespas Nasonia são "haplodipóides", isto é, os machos têm apenas um conjunto de cromossomos (são "haplóides"), as estruturas que abrigam os genes; já as fêmeas têm, assim como os seres humanos, dois conjuntos de cromossomos (são "diplóides").
Isso ocorre porque as fêmeas saem de ovos fertilizados, enquanto machos surgem de ovos que não o foram.
"Compreender como os organismos controlam a determinação do sexo é uma das questões mais importantes para as ciências biológicas", afirma Cristino.
"Sabemos agora que, para produzir um organismo viável, não é necessário ter os dois conjuntos de cromossomos de origem paterna e materna, basta um para ter todas as instruções de como construir um organismo", diz ele.
Lado humano
Apesar do tamanho diminuto, as vespinhas têm um belo genoma: 17 mil genes. A análise revelou que 12% deles se encontram só nestas vespas e 2,4% se encontram somente em insetos himenópteros (vespas, abelhas e formigas).
"E 40% destes genes também são encontrados em humanos. Esta vespa possui mais genes em comum com humanos do que todos os outros insetos com genomas sequenciados até agora", diz outro autor, Francis Morais Franco Nunes, também da USP de Ribeirão Preto.
A equipe de instituições brasileiras estudou um grupo de genes essenciais para o ciclo de vida dos insetos, que codificam proteínas chamadas "hexamerinas", usadas como reserva de aminoácidos para a construção de estruturas do organismo durante a metamorfose. São genes essenciais para os insetos atingirem o estágio adulto.
Já veneno da vespa é fundamental para ela paralisar o inseto alvo e poder depositar ovos. Metade dos genes que codificam moléculas do veneno das Nasonia era desconhecida antes do sequenciamento.
Há enorme variação no modo de ação dos venenos. Segundo os pesquisadores brasileiros, ele pode agir ao parar o desenvolvimento da pupa, alterar a fisiologia e o crescimento do organismo, suprimir a resposta imune, paralisar, causar morte celular e até mesmo provocar alterações do comportamento.
Ou seja, as vespinhas são donas de uma farmacopeia com excelente potencial para a elaboração de novas drogas.
Fonte: Folha Online
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